Coluna Asas #58 - Capítulo prolixo de um romance embrião - (Catarina Cunha)
Dia desses, em um grupo de escritores na rede social joguei
essa frase, título desta crônica, para diferenciar um projeto de um romance de
um conto.
Debatíamos sobre escrever contos com limite de três mil
palavras, que poderiam ser mais. Eu, que sou da turma de tentar fazer mais com
menos, alertei para o risco de alguns
confundirem romance com conto. A questão não é o tamanho caber no conteúdo, e
sim conteúdo caber no tamanho. Temos
contos gigantes e pequenos romances geniais. Como tenho poucos argumentos
acadêmicos costumo fazer comparações, não raramente esdrúxulas.
Imagine um cidadão que resolve construir um castelo em um
terreno de 336 m². É possível? Sim, Gino Coppedè conseguiu produzir uma pérola da
arquitetura: o Castelinho do Flamengo, ricamente desenhado por dentro e por
fora, com pequenos e amplos salões iluminados, sendo cada piso, vitral, pintura,
escadaria, sanca, estátua, fundamental
para a harmonia do espaço e desenvolvimento da trama. Logo o arquiteto
conseguiu construir um conto completo, onde não falta e nem sobra nada, com
todos os elementos que um castelo exuberante merece.
Entretanto
existe o caso oposto, o mesmo desejo, construir um castelo, mas comprando um
terreno de 10 km². Desenha seus sonhos
com 150 suítes, salões de jogos, de festa, de cinema e teatro, piscina olímpica
e jardim de matar o Palácio de Versalhes de inveja. Todos os personagens
riquíssimos a serem inseridos em uma estupenda explosão de glamour. Ocorre que
seus recursos foram limitados a meros 500 m². O proprietário desiste do sonho?
Jamais. O arquiteto, o engenheiro e até o mestre de obras avisam ao
proprietário que é impossível, tecnicamente, colocar a lua dentro de uma bola
de gude.
Não
teve jeito. Foi dada a ordem de começar pelas fundações do projeto original. As
verbas e ideias acabaram e o sonho do castelo virou uma estrutura mal
assombrada, cheia de quadradinhos ocos que seriam micro suítes no cérebro do
escritor. Cenários imaginários ricamente descritos para nunca serem usados por
personagens fantasmas.
Quem passa pela rua, o leitor, não entende
nada. O que poderia ter sido esse enorme esqueleto de concreto abandonado? Um
conto? Não seria possível. Talvez um romance. Talvez o maior e melhor romance
de todos os tempos.
Crédito da foto: Kenia Castro
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