Coluna Asas #21 - Quando entrevistei o filho de John Fante (Felipe Rodrigues Araujo)

 


John Fante morreu, mas deixou um grande legado. Além da sua produção toda, contando clássicos como “Espere a Primavera, Bandini” e “Pergunte ao Pó”, passou o ofício de escritor para Dan Fante, seu filho. Lembro-me mais ou menos. Era final de 2007, as luzinhas já caindo pelas janelas. Eu procurava por contos do FILHO DO HOMEM em português e acabei caindo em seu site oficial. Logo na abertura, ouvia-se uma sequência de sucessos do blues tradicional, além de indicações de alguns escritores novos (bravo, Dan!), livros do autor e recortes com críticas que tinham saído em jornais e revistas.

Anotei o e-mail do cara e resolvi entrar em contato. Na época eu era um ASPIRANTE A JORNALISTA COM UM BLOGSPOT. Então, como diabos iria convencê-lo a responder as minhas perguntas? Convencido de que Dan Fante deletaria o e-mail e fumaria outro cigarro, resolvi inventar que eu era de algum jornal. Se bem me lembro, disse que a entrevista seria para um jornal de “grande circulação” de São Paulo.

Inexperiente e sem nenhum material sobre Dan Fante para ler – à época nem a Folha de S. Paulo e nem o El País tinham ROUBADO A MINHA IDEIA (hehe) – elaborei algumas perguntas – muitos clichês e questões ingênuas – e enviei para o cara. Na outra semana, para o bem ou para o mal, ele me retornou.

O homem foi RÁPIDO E RASTEIRO nas respostas. Foi inevitável fazer perguntas sobre seu pai, mas acho que isso não o incomodou. Infelizmente, não consegui falar muito sobre a sua obra, afinal, seus livros ainda não tinham sido publicados no Brasil – e ainda não foram (passados sete anos). Porém, ganhei um presente de Natal. Ele me mandou na íntegra o arquivo final de “86’d”, à época seu último romance.

BRUTAS, SECAS, ÁCIDAS e por vezes blasés, seguem as respostas de Dan Fante à minha “entrevista”.

Você já leu algum escritor brasileiro?
Infelizmente, não tenho familiaridade com escritores brasileiros. Eu leio somente em “americano” e costumo odiar traduções.

Como foi a amizade com Charles Bukowski?
Eu conheci Hank. Ele costumava visitar meu pai. Admiro sua poesia, extremamente.

Algum de seus livros será lançado no Brasil?
A editora Harper Collins vai lançar quatro de meus livros, eu espero que todos eles sejam traduzidos.

Aqui no Brasil é muito difícil ser escritor ou até mesmo lançar um livro, como isso funciona nos Estados Unidos?
Você talvez precise de uma pistola para fazer os editores lerem seu trabalho. É muito difícil, os americanos perderam o costume da leitura. Um escritor tem que ser persistente.

Quais escritores novos você lê?
Não muitos. Tony O’Neill tem um bom livro que sairá agora e há uma boa coletânea de histórias de Mark SaFranko (da Murder Slim Press, Inglaterra). Vale a pena ler os dois.

Qual é o seu maior objetivo com a literatura?
Ter todo o meu trabalho lido e publicado em todos os países.

Você ainda tem um trabalho miserável?
SIM, SOU UM ESCRITOR.

A que se deve o sucesso dos seus livros na Europa?
Europeus têm bom gosto para escritores.

Você poderia contar alguma história sobre seu pai?
Ele fez muita grana escrevendo todos os dias para os estúdios de Hollywood. Fazia uma reunião com sua secretária todas as manhãs e dizia para ela que anotasse todos os recados, então ia jogar golf. ELE FEZ ISSO POR 20 ANOS.

No seu site tem uma apresentação de slides com algumas de suas fotos, que música é aquela? Que tipo de música você gosta?
Eu gosto de blues norte-americano: John Lee Hooker, Jimmy Reed, Sonny Terry e Brownie McGee.

Como era a cena beat do Greenwich Village quando você tinha 19 anos?
Era engraçado: um monte de poetas loucos e todo mundo queria mudar o mundo. Então chegou Lyndon Johnson…

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Infelizmente, Dan Fante faleceu no dia 23 de novembro de 2015, aos 71 anos, em Los Angeles.

Fica o registro.

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